Em Pernambuco, são pelo menos 800 terreiros, liderados, em sua maioria, por homens e mulheres negros, os chamados babalorixás e ialorixás, que passam essa missão de geração em geração.
Foto: Egbé Omo L'omi/Arquivo Pessoal
Cerca de 3% da população brasileira pertence a alguma das religiões de matriz africana, como a Umbanda, o Candomblé, ou como o Xangô de Pernambuco. Para além das diferenças, essas religiões se encontram em um espaço de acolhimento e resistência: o terreiro.
Em Pernambuco, são pelo menos 800 terreiros, liderados, em sua maioria, por homens e mulheres negros, os chamados babalorixás e ialorixás, que passam essa missão de geração em geração.
Entre Zumbi do Pacheco, em Jaboatão dos Guararapes, e o Ibura, no Recife, surgiu em 2019 o terreiro Egbé Omo L’Omi, o qual tem contribuído para educação, cultura e fé do povo daquela localidade recorrentemente afetada pelas chuvas na Região Metropolitana, sob a liderança da ialorixá Janielly Azevedo.
Janielly Azevedo
“Esse espaço aqui é um espaço de cuidados, sabe? Na hora da chuva foi a gente que estava junto, na hora da agonia foi a gente que estava junto. Então eu não consigo sair daqui para o que for. A gente acaba ajudando outras pessoas. De 2020 para cá, a gente já ajudou quase treze pessoas do terreiro a entrar na universidade”, afirma.
Janielly se refere ao projeto Feira de Troca, uma das iniciativas desenvolvidas no terreiro, e quem tem o objetivo de ajudar filhos e filhas de santo a entrar e se manter no ensino superior, com instruções importantes sobre o ambiente acadêmico.
Intolerância
Mas, um espaço como esse também acumula casos de desrespeito. Há pouco menos de dois anos, Janielly precisou denunciar ataques constantes, feitos pelos próprios vizinhos, ao terreiro em que é ialorixá. Chegaram a jogar pedras, lixo e até uma bomba, com o objetivo de acabar com os cultos.
“A gente sofreu um monte de violência aqui no terreiro, né? E só parou com essas violências porque a gente chamou a imprensa. E aí foi que essa única pessoa da vizinhança parou de causar esse transtorno. Você sempre vai ouvir algumas gracinhas. A gente já ouve que está repreendido, que está amarrado, que o sangue de Cristo tem poder. Então, não é que exista mais respeito, é que a gente está se impondo mais”, acredita a Ialorixá.
Só em 2023, o Brasil registrou 1.418 denúncias voltadas à intolerância religiosa feitas pelo Disque 100. Esses casos aumentaram principalmente após a pandemia de covid-19.
Resistência
Ainda que a liberdade de culto seja um direito constitucional, lideranças e seguidores das religiões de matriz africana precisam criar estratégias de resistência diariamente. No terreiro da ialorixá Janielly Azevedo, não foi diferente.
“Tem um censo que a gente fez na perspectiva de denunciar a violência, mas a gente não sabia o que a gente estava produzindo. Era um censo, era um infográfico? A gente só estava fazendo porque estava sofrendo violência e não queria que outro terreiro, que outro espaço de fé sofresse também”, concluiu.
Aprovado em edital em 2019, o objetivo do censo, interrompido em 2020 por falta de recursos, é mapear todos os terreiros do Ibura, tanto na parte que pertence ao Recife, quanto a Jaboatão.
O terreiro Egbé Omo L'Omi é um exemplo de luta, e Janielly Azevedo, sua principal líder, é a representação do quanto esse lugar é importante para o passado, o presente e o futuro do povo negro.
Ouça a matéria especial do repórter Lucas Arruda no 'Play' acima.
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